Opinião de Saibana Baldé: Guiné-Bissau – A Saga Continua


Artigo de Opinião no Jornal Binókulu - Cabo Verde

Analisando a questão à primeira vista – sim porque porquanto não se vislumbra dados concretos sobre a situação – toda gente pasma-se com a sofisticação deste grupo que concretizou em pleno as suas intenções e numa acção rápida e sem registo de mortes a lamentar, conseguiu capturar as mais altas figuras do Estado e controlar o país. Parece que o Comando Militar, como se dominam no comunicado, conta com apoio da generalidade de militares – ou pelo menos – os que não estão de acordo não mostram resistência.Falar de Golpes de Estados na Guiné-Bissau remete-nos sempre para a infeliz sensação de que nada é novo. Os guineenses vivem constantemente nestes levantamentos e insurreições da classe castrense, de tal modo que a população deixou-se de impressionar pelas armas e presença militar nas ruas. Raras vezes aceitam abandonar as suas casas. – Nô kansa dja – (estamos cansados) é a frase que mais pronunciam os meus irmãos e as minhas irmãs.
Outra vez Guiné-Bissau! – esta é uma das reações mais vulgares nas pessoas. Sim é outra vez das várias vezes que guineenses não se entendem e levantam-se com armas para resolver um problema ou vários escamoteados problemas. Há, também, que registar outra reação curiosa nas pessoas, algumas delas com imensas responsabilidades institucionais – como é o caso do Eng.º Domingos Simões Pereira – Secretário Executivo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa – CPLP, que assumiu durante uma entrevista à RTP “…de facto os sinais eram evidentes”. E acrescenta que para todos havia a esperança que “… as pessoas não iriam fazer o óbvio”. O Eng.º Domingos Simões Pereira conhece bem a questão. E de facto nem é preciso ter grandes conhecimentos sobre a Guiné-Bissau para entender que depois de tantos acontecimentos – entre as ditas tentativas de Golpes de Estados e assassinatos – num curto espaço de tempo, de 2008 a 2011 – assassinatos de Presidente Nino Vieira e do General Tagme Na Waie, depois a morte de Baciro Dabo candidato à presidência da República e do Deputado Hélder Proença e por aí adiante – nada devia surpreender a ninguém.
Ao dizer a saga contínua refiro-me a continuidade de insurreição militar mas também às atitudes pouco e nada responsável por parte dos grandes responsáveis militares e políticos. Segundo notícias, os partidos políticos da oposição dizem concordar com o Golpe, pasmar-se-ia alguém se disser estou espantado? Mas, ainda a esquecer este artigo, recebo uma notícia em que os cinco candidatos que contestavam resultados eleitorais condenam com veemência a acção militar. Mais quando começo a analisar a questão de fundo, com uma imparcialidade de posição e colocando-me num ponto de quem quer responder aos apelos dos meus amigos, que me perguntam:
O que se passa na Guiné-Bissau?
Em primeiro lugar, o que passa na Guiné-Bissau é um Golpe de Estado perpetrado pelos militares intitulados Comando Militar, que apresentam como razões uma suposta conspiração entre o Governo, através do Primeiro-Ministro (com mandato suspenso em virtude da sua participação nas eleições presidenciais, agora em suspenso, num momento em que o segundo candidato mais votado Kumba Ialá recusa-se a participar na segunda volta por considerar que houve ilegalidades no processo, tendo ao seu lado mais quatro candidatos), o Estado angolano e organizações regionais para envio de forças internacionais para atacar os militares guineenses. Veja-se que neste momento existe uma força angolana na Guiné-Bissau que tem mandato de retirada depois de desentendimento com as autoridades militares do país. Pois segundo a classe castrense Guineense os angolanos estão altamente armados no país violando aquilo que era o acordo da sua estadia – acredita-se nesta verdade porque não houve nenhum desmentido.
Mas a pergunta – Acredita que existe mesmo este acordo para agressão dos militares nacionais através de uma força internacional?
A minha resposta é simples: não me parece, mas tudo é possível, ainda que não seja no termo em que se coloca a questão. Mais, acredito que houve extremismos de posições. Acredito porque ouvi com atenção o comunicado dos militares guineenses dias antes a explicitar o desenrolar da crise, com um grau altamente “impostor” de Angola, através do seu embaixador que chegou ao ponto de questionar CEMFA da Guiné-Bissau se a informação dos seus Serviços Secretos sobre eventual golpe, em preparação, seria verdade.
Penso que exercício de reflexão deve levar-nos a questionar sobre a posição do outro, e portanto, imagino qual será a posição dos militares guineenses perante esta “intromissão” de Angola no país. Veja-se que acentuaram-se as movimentações deste país na Guiné-Bissau. E, portanto, podemos assim dizer assim que este levantamento apresenta factores externos altamente perigosos.
Não menosprezo a enérgica condenação – quer pelas palavras como ameaças de envio das forças de interposição – pois não sou ingénuo ao ponto de pensar que a mesma é inocente e deriva-se da preocupação com o povo.
Ainda sobre factores externos no problema da Guiné-Bissau, parece-me que esquece-se o papel da geopolítica. Este país enquanto instável beneficia directamente muitos actores regionais e falo directamente de Senegal – que por arrasto traz a Costa de Marfim, estes países não gostam da força angolana numa zona tão distante do seu território, lembra-se que actual presidente de Costa de Marfim tem divergências profundas com a Angola por considerar que este país apoiou o seu opositor na contenda pós-eleitoral no seu país. Mais ainda dizer que Senegal queixou-se à Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental – CEDEAO.
Não me revejo nos comentários superficiais e infundados que abundam quando se fala da Guiné-Bissau e desta situação em particular. A questão é muito mais profunda do que simples “etnização”, não é verdade que nesta ou noutras circunstâncias as revoltas foram concretizadas por uma ou outra etnia. Nem é verdade que exista risco da sociedade guineense entre numa guerra civil e/ou étnico. Só os guineenses sabem quão homogénea é a sua sociedade. Ainda que reconheça que está latente uma “inocente” identificações étnicas e religiosas no país, no entanto, altamente insuficiente para despoletar uma guerra entre guineenses.
O que a Comunidade Internacional – agora zangada e ameaçadora – esqueceu de dizer/pensar é a sua responsabilidade nesta questão. Quando no auge das crises deste país – assassinato de Presidente da República e de Chefe de Estado Maior das Forças Armadas – não se viu nem a CPLP nem ONU em tons graves como estes agora.
Este artigo não visa abordar possíveis caminhos e soluções para este problema, mas antes de terminar lanço um olhar sobre os três pontos que são importantes qualquer pessoa saber sobre este país:
  1. Falar da Guiné-Bissau é falar de um país onde todos os intervenientes são altamente culpados pelas constantes crises ocorridos. Onde ninguém e tal como aparece, porque no tabuleiro dos jogos de interesses muda-se de cor como se troca de camisa. Porque a história da Guiné-Bissau está cheia de episódios por esclarecer, sempre com ingredientes chocantes da morte de figuras proeminentes do país, e isso fragmenta a sociedade e cria bolsa de descontentes que são grupos que vão jogando o seu interesse consoante a situação.
  2. Falar da Guiné-Bissau é falar de um país com elevado índice de pobreza e subsistência para pessoas, se comparamos com a noção de posse que possuem. São pessoas que pela sua ambição pessoal vão participando em situação de inversão de ordem com intuito de benefício pessoal. Veja-se que a progressão na classe castrense faz-se arbitralmente e sempre depois dos casos.
  3. Estamos a falar de um país onde a inércia da população – incluindo a sua Diáspora – que aceita com brando costumes todas as alterações e subversões de ordem constitucionais.

Continuemos a aguardar os próximos capítulos deste acontecimento, certo é que não será igual aos outros, visto que nem guineenses nem a Comunidade Internacional está disponível para aceitar tal. 

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